Ganhe quem ganhar hoje, não há boas notícias para os
americanos. Tanto Hillary quanto Trump — caso coloquem em prática suas
respectivas plataformas — serão um desastre para a principal economia mundial,
ainda que por razões distintas: Hillary sufocará os poupadores, investidores e
trabalhadores qualificados com mais impostos; já Trump condenará todos os
pagadores de impostos a um Himalaia de dívida pública.
Hillary
Clinton: mais gastos e mais impostos
Comecemos pela candidata democrata. Hillary é uma
das aspirantes à presidência dos EUA que mais abertamente defende o estatismo e
o intervencionismo governamental em toda a história do país: embora seja
natural candidatos democratas defenderem mais estado, o fato é que a
incompetência de seu rival lhe permitiu assumir o risco eleitoral de manter um
discurso muito mais liberticida do que o habitual em eleições. (Perante
qualquer outro rival minimamente mais libertário, Clinton não teria a mais
mínima chance de vencer com semelhante radicalismo).
Consequentemente, a
democrata almeja incrementar (ainda mais) o tamanho do ineficiente, caro,
esbanjador e distorcido estado de bem-estar americano:
Na educação, promete gastar durante a próxima década
US$ 700 bilhões a mais em bolsas universitárias e pré-universitárias (avançando
progressivamente até a estatização de fato da educação nos EUA).
Para a saúde, desembolsará US$ 250 bilhões
adicionais para aprofundar o já falido
Obamacare (por meio da expansão da cobertura dos extremamente caros Medicaid
e Medicare, o que, de novo, levará a um progressivo avanço da estatização
da saúde dos EUA).
Para a infraestrutura, seu plano é destinar US$ 300
bilhões adicionais para a reforma de estradas, portos, aeroportos e ferrovias.
Finalmente, mais US$ 500 bilhões serão destinados às
mais diversas rubricas, como licença-maternidade, subsídios às indústrias
nacionais, programas de estímulo econômico etc.
Um esbanjamento de dinheiro dos americanos estimado
em US$ 1,750 trilhão pelos próximos dez anos.

Gráfico
1: plano de aumento de gastos de Hillary Clinton
E como Hillary pretende pagar tamanha fatura?
Evidentemente, com mais impostos. Mais de um trilhão de dólares virá do aumento
do IRPF dos trabalhadores mais qualificados do país (aqueles que ganham mais de
US$ 190 mil dólares por ano). Outros US$ 400 bilhões virão da abolição de
deduções fiscais (o que, na prática, significa aumento de impostos). Um aumento
dos impostos sobre os ganhos de capital dará mais US$ 350 bilhões de dólares
para o governo. E um imposto especialmente punitivo para as grandes fortunas
gerará mais US$ 300 bilhões para o governo.
Ou, ao menos, é isso o que a equipe de Hillary imagina.
Mas tem mais: a candidata democrata também pretende
aumentar a arrecadação do IRPJ aumentando a base de contribuição, o que tende a
afetar as pequenas empresas. Quer também punir com severas multas as empresas
que não repatriarem lucros do exterior (gerando ao governo US$ 150 bilhões).
Elevará as alíquotas do imposto sobre herança (mais US$ 250 bilhões) e, por
fim, criará um novo tributo sobre as instituições financeiras (US$ 150
bilhões).
No total, US$ 1,60 trilhão nos próximos 10 anos.

Gráfico
2: plano de aumento de receitas de Hillary Clinton
Em suma: embora o plano fiscal de Hillary não irá
necessariamente explodir o endividamento do governo (US$ 150 bilhões em 10
anos, muito embora é importante ressaltar que a dívida total aumentará mais US$
10 trilhões durante este período pelo efeito dos juros), ele resultará em um
aumento acentuado do parasitismo estatal sobre a sociedade americana.
Rapinar a poupança e a criação de riqueza para
incrementar a dependência dos subsídios estatais de uma parcela crescente da
sociedade (seus atuais e futuros eleitores), e sufocar a economia privada em
prol do aumento do estado não é um plano condizente com a liberdade.
É verdade que Hillary, sendo comprovadamente uma
mentirosa compulsiva — como são todos os políticos —, poderia muito bem estar
enganando os eleitores sobre suas
reais intenções. Porém, analisando sua trajetória e as intenções do
establishment democrata, tudo indica que seu programa fiscal avançará pelo
caminho da servidão.
Donald
Trump: populismo fiscal com mais endividamento
Muito já foi dito sobre as propensões protecionistas
e neo-mercantilistas de Trump. Ele já prometeu uma tarifa
de importação de 45% sobre todos os produtos chineses, e ameaçou retaliar
economicamente a Ford caso
esta abra mais fábricas no México. Essa torrente de idéias políticas
impressionou até mesmo o site esquerdista Vox, que publicou um artigo
sobre "as ideias econômicas de esquerda que Trump está
adotando".
Sendo assim, aqui iremos nos concentrar em sua
política fiscal, como feito acima com Hillary.
Trump vem baseando sua proposta fiscal em uma
acentuada redução de impostos para famílias e empresas. Por esta razão, alguns
liberais e libertários passaram nutrir simpatias pelo candidato no âmbito
estritamente econômico: frente à voracidade tributária de Hillary, o magnata
nova-iorquino parece ao menos trazer um sopro de alívio sobre os pagadores de
impostos americanos.
No entanto, e aí jaz o principal problema de suas
promessas eleitorais, todo o seu prometido corte de impostos não passa de um
mero populismo fiscal, pois não haverá nenhum corte de gastos. Ao contrário:
Trump promete redução de impostos e aumento de gastos, o que significa que
uma eventual redução de impostos será inteiramente financiada por mais
endividamento do estado, o que, por sua vez, significa que quem realmente
arcará com a fatura serão as gerações futuras. "Baixo seus impostos hoje e
cobro a fatura amanhã, com juros". Eis aí a clássica definição do populista.
Keynes estaria orgulhoso.
Comecemos pela sua redução
de impostos. Trump promete uma autêntica revolução nos impostos sobre a
poupança e o investimento: a alíquota máxima do IRPJ será diminuída dos atuais
35% para 15%. Lucros repatriados do exterior serão tributados em 10%. As
indústrias poderão colocar em seus balancetes uma depreciação mais acelerada de
seus ativos (o que reduz a mordida do imposto de renda). Tudo isso gerará uma
redução de US$ 2,85 trilhões em 10 anos.
Adicionalmente, o republicano também promete
eliminar o imposto sobre heranças (US$ 200 bilhões).
Mais: Trump também promete aliviar o IRPF reduzindo
o número de alíquotas: as atuais 10%, 15%, 25%, 28%, 33%, 35% e 39,6% seriam
reduzidas para apenas três: 12%, 25% e 33%.
Ao mesmo tempo em que pretende eliminar várias
deduções fiscais, ele promete criar outras vinculadas à dependência e ao
cuidado de crianças (a redução total seria de US$ 1,45 trilhão).
No total, portanto, estamos falando de uma redução
de receitas da ordem de US$ 4,5 trilhões em dez anos.

Gráfico
3: redução das receitas do governo segundo o plano de Donald Trump
Pessoalmente, sempre sou a favor de toda e qualquer
redução de receitas do governo. Qualquer política que venha a implantar tamanha
redução de impostos sobre famílias e empresas tem minha simpatia. No entanto,
para que tal medida gere efeitos positivos e duradouros (e não meros vôos de
galinha que cobram um preço alto no futuro), tal corte de impostos tem necessariamente de ser acompanhado de um
igual corte de gastos.
É imprescindível que uma redução de impostos seja feita
concomitantemente a um corte de gastos. Caso contrário, a diferença será obtida
por meio do endividamento do estado, o que significa que um dinheiro que
poderia estar indo para o financiamento de atividades produtivas será
integralmente direcionado para os títulos púbicos do Tesouro, financiando os
déficits do governo. E com o agravante de que essa conta terá de ser paga, com
juros, no futuro.
O que realmente mensura o tamanho do parasitismo
estatal não é a carga tributária, mas sim o quanto o estado efetivamente gasta.
Cada centavo gasto pelo estado foi retirado da economia privada, seja via
impostos seja via empréstimos tomados pelo governo junto ao setor privado. Se os gastos do governo não são atacados, o
parasitismo estatal continua intacto.
E que Trump apresentou nessa área? Nada de positivo.
Embora ele de fato tenha apresentado uma ideia
chamada de Penny Plan (na
qual os gastos discricionários do governo seriam reduzidos em 1% ao ano), essa
proposta, mesmo que fosse integralmente implantada, seria completamente inócua
para equilibrar o orçamento após a forte redução de receitas.
Mas tudo piora: se somarmos todas as promessas de
aumentos de gastos feitas por Trump, o gasto público não apenas não cai como,
ao contrário, aumenta (menos que sob
Hillary, mas aumenta).
Mais especificamente, se Trump de um lado propõe cortes
de 1% ao ano durante os próximos 10 anos (o que daria US$ 750 bilhões ao ano)
em conjunto com um maior rigor sobre os subsídios estatais (um corte adicional
de US$ 175 bilhões), ele também defende aumentos notáveis em outras rubricas:
aumento dos gastos militares com mais tropas e mais equipamentos; modernização
das forças armadas em questões de ciber-segurança e na guerra contra o Estado
Islâmico (mais US$ 450 bilhões); e maiores transferências sociais para os
veteranos de guerra (entre US$ 500 bilhões e 1 trilhão).
Mas agora vem o melhor: Trump simplesmente promete duplicar
os gastos de Hillary em infraestrutura (US$ 600 bilhões, podendo chegar a US$
1 trilhão).
No total, tirando por baixo, estamos falando de um
aumento do gasto público de US$ 650 bilhões em 10 anos.

Gráfico
4: aumento dos gastos do governo segundo o plano de Donald Trump
Dito de outra forma, Trump pretende reduzir a
arrecadação do governo em US$ 4,5 trilhões e aumentar os gastos em US$ 600
bilhões: um buraco fiscal de mais de US$ 5 trilhões de dólares.
Isso não é reduzir impostos e nem muito menos
reduzir o estado. Isso é simplesmente custear uma campanha eleitoral
endividando furiosamente os pagadores de impostos americanos para que eles
próprios arquem com a fatura no futuro.
Na melhor das hipóteses, levando em conta eventuais
aumentos marginais na arrecadação gerados pela redução de impostos — como
pressupõe a Curva de Laffer —, estamos trabalhando com um déficit de pelo
menos US$ 3,2 trilhões.
Considerando que dívida total aumentará mais US$ 10
trilhões durante este período pelo efeito dos juros, o orçamento do governo
federal sob Trump levaria a um déficit acumulado de pelo menos US$
13 trilhões em 10 anos, o que dá mais de US$ 1 trilhão por ano.
Vale repetir: incluindo estimativas muito otimistas
a respeito das promessas de Trump, seu programa fiscal implica aumentar
acentuadamente o endividamento do governo (ou seja, dos pagadores de impostos
americanos) em pelo menos US$ 13 trilhões na próxima década. O "extravagante e
pródigo" Obama aumentou em "apenas" US$ 8,7 trilhões em seus dois mandatos —
sendo que boa parte havia
sido contratada ainda sob o governo de George W. Bush.
Conclusão
Tanto Hillary Clinton quanto Donald Trump
apresentaram propostas fiscais incrivelmente irresponsáveis. Hillary pretende financiar suas promessas de
mais gastos com novos e maiores impostos. Já Trump planeja o mesmo por meio de muito
mais endividamento.
O plano de Clinton é lamentavelmente factível: a
candidata democrata continuará percorrendo o caminho já iniciado por Obama de
ir expandindo pouco a pouco o tamanho do estado para evitar que o sapo (os
pagadores de impostos) perceba que está sendo cozinhado na água quente
(estima-se que a dívida pública aumentará 11 pontos percentuais em relação ao
PIB sob Hillary).
As propostas de Trump são, por sua vez, puro
populismo fiscal. E irrealizáveis: o próprio candidato republicano já teve de
retificar várias vezes suas
propostas fiscais (segundo as quais o IRPF teria apenas três alíquotas de
10%, 15% e 25%) porque a queda na arrecadação era demasiada grande e não-financiável
até mesmo para seus padrões. (Originalmente,
estimava-se que sua administração aumentaria a dívida em mais de 50 pontos
percentuais em relação ao PIB; agora, "apenas" 30 pontos).
Hillary possui um programa pavoroso, porém, e infelizmente, realizável;
Trump possui um programa igualmente pavoroso, porém não-realizável. (Se bem que
a alternativa que ele venha a apresentar caso vença pode ser ainda pior).
Hoje, milhões de americanos irão às urnas. Melhor fariam
se se rebelassem contra elas por terem de escolher entre dois desastres
igualmente deploráveis.