segunda-feira, 19 mar 2018
Ela é uma gigante e é considerada uma das varejistas
de brinquedos mais famosas do mundo, se não a mais famosa. Agora, no entanto, vai
fechar
todas as suas 735 lojas nos EUA.
Em comunicado divulgado nesta quinta-feira, dia 15
de março, o presidente da Toys 'R' Us, David
Brandon, afirmou:
"Estou muito decepcionado com o resultado, mas não temos mais apoio financeiro
para continuar com as operações da companhia nos Estados Unidos". A rede opera
no país há 70 anos e emprega
mais de 30 mil pessoas.
Em setembro de 2017, a varejista já havia entrado
com um pedido
de recuperação judicial nos EUA, com o objetivo de tentar reestruturar suas
dívidas (o que, na prática, equivale a uma proposta para tornar seus credores
acionistas). No entanto, de nada adiantou: sem encontrar um comprador ou chegar
a um acordo com os credores, a empresa anunciou semana passada a liquidação das
unidades norte-americanas, ainda sem detalhes divulgados.
A rede tem também operações em diversos outros
países. No Reino Unido, as operações também serão liquidadas, mesmo
procedimento que ela prevê para a Ásia, Canadá, Áustria, Suíça e Alemanha. Para
as operações em outros países, ela afirma estar com opções em aberto. "O grupo
e seus conselheiros vão se esforçar para minimizar o impacto da liquidação nos
mercados canadenses e no exterior", disse David Brandon no comunicado.
Ainda em setembro, quando entrou com o pedido de recuperação
judicial, a dívida da Toys 'R' Us era de US$ 5 bilhões. Anualmente, a empresa
estava gastando mais de US$ 400 milhões para pagá-la, ao mesmo tempo em que não
lucrava o suficiente.
Breve
histórico
A empresa foi criada em 1948
por Charles Lazarus, aproveitando-se do grande "baby boom" (explosão demográfica)
que ocorreu nos EUA após a Segunda Guerra Mundial. Lazarus abriu seu primeiro
estabelecimento em Washington sob o nome de Children's
Bargain Town.
Em 1957, foi adotado o nome Toys 'R' Us, e foi com
ele que a empresa abriu seu capital na bolsa em 1978. Em março de 2005, um
consórcio integrado pelos fundos de investimento Kohlberg Kravis
Roberts, Bain Capital
e Vornado Realty
Trust chegou a um acordo para retirar a empresa da bolsa, comprando todas
as suas ações por US$ 6,6 bilhões. Em 2013, a empresa abandou seus planos de
voltar à bolsa.
Desde então, a empresa veio mantendo um elevado
endividamento, o que limitou sua capacidade de investir em planos para
crescimento, entre eles o desenvolvimento de seu portal de vendas pela
internet.
E isso foi fatal.
Quem
manda é o consumidor
Kodak, Nokia,
Blockbuster, Toys 'R' Us. Durante décadas, todas essas
empresas pareciam imbatíveis e absolutamente dominantes em seus respectivos
mercados.
Hoje, no entanto, ou elas já foram absorvidas por
outras empresas ou simplesmente declararam falência. A bancarrota da Toys 'R' Us,
que por décadas concentrou as demandas de pais e filhos ao redor do mundo, é
apenas o mais recente episódio desta história sem fim.
Ao contrário do que muitos afirmam, o capitalismo não
é um sistema econômico que privilegia as grandes empresas: o capitalismo é um
sistema econômico que expõe todas as empresas — grandes, médias e pequenas —
a um contínuo processo de concorrência,
o qual é orientado pela satisfação das necessidades dos consumidores. Em uma
economia capitalista, quem está no comando são os consumidores. São eles que
decidem o que comprar, quando comprar, de quem comprar e em qual quantidade. São
suas decisões de comprar ou de se abster de comprar que determinam a
viabilidade dos empreendimentos.
E, como consequência, somente aquelas empresas
capazes de satisfazer, a todo e qualquer momento, as necessidades dos
consumidores da melhor maneira possível conseguirão sobreviver neste processo
competitivo, não importa qual seja seu
tamanho.
Por isso, é um total equívoco imaginar que o
capitalismo funciona primordialmente para beneficiar os produtores. Ao contrário:
quem está no comando são os consumidores. Consumidores sempre estão
interessados apenas em conseguir as melhores barganhas para si próprios. Eles não
estão interessados em facilitar a vida dos empreendedores (e nem dos empregados
destes empreendimentos).
Consequentemente, quem determina a
sobrevivência de empresas, lucros, empregos e salários são os consumidores, e não os
capitalistas. Os críticos do capitalismo jamais entenderam isso.
A Kodak,
que por décadas reinou absoluta no mercado fotográfico, sucumbiu perante o
surgimento das câmeras fotográficas digitais. Ela não soube adaptar seu modelo
de negócios aos novos produtos que seus concorrentes haviam começado a oferecer
de forma mais eficiente e com melhor custo-benefício do que a própria Kodak. A popularização
dos smartphones e suas câmeras fotográficas cada vez melhores enterrou por vez
a empresa, que pediu
recuperação judicial em 2012.
A Nokia,
que era onipresente no mercado de aparelhos celulares no início da década de
2000, sucumbiu ante a chegada dos smartphones. A multinacional finlandesa, que
simplesmente dominou o comércio mundial de telefones celulares de primeira geração
durante 13 anos, não foi capaz de bater os padrões de qualidade e
funcionalidade dos novos aparelhos ofertados por outros fabricantes, como Apple
e Samsung. Em 2007, a empresa ainda era a líder mundial na fabricação de
celulares e detinha aproximadamente 40% do mercado mundial de telecomunicações.
Em 2013, ela era apenas a 274.ª maior empresa mundial.
A Blockbuster, que já foi
simplesmente a maior rede de locadoras de filmes e videogames do mundo,
sucumbiu perante a chegada dos vídeos por streaming.
O surgimento destes serviços tornou totalmente absurda e impensável a ideia de ter
de sair de casa e ir a uma videolocadora para poder assistir a um filme. Os serviços
de streaming concentraram a demanda doméstica por lazer em provedores como
Netflix e Amazon Prime. E os próprios canais de TV a Cabo também adotaram esta
tecnologia, como HBO Go, Fox Premium e Telecine Play, mostrando que querem
saciar a demanda dos consumidores.
(E, para aumentar ainda mais a ironia da situação, a
própria Blockbuster teve a oportunidade de comprar, anos atrás, a Netflix pelo módico
preço de 50 milhões de dólares. Declinou. Foi à falência em 2010 e fechou
todas as lojas que tinha. Eis aí um grande exemplo de incapacidade de antecipar
a demanda dos consumidores.)
Hoje, a Toys 'R' Us sucumbiu perante o varejo
online, ou seja, perante o surgimento de novas fórmulas de comercialização de
bens e serviços. O crescimento
da Amazon tornou obsoleta a fórmula de grandes estabelecimentos físicos ultra-especializados,
que sempre foi a fórmula adotada pela outrora gigante norte-americana.
Conclusão
Há vários outros exemplos de grandes sendo
impactadas de maneira inclemente. A internet reduziu a demanda dos consumidores
pelos grandes jornais tradicionais, que hoje operam no vermelho.
A Google alterou completamente a indústria de marketing. Uber, Lyft e Cabify
afetaram severamente a demanda pela indústria de táxis.
Para onde quer que você olhe, não importa qual seja
o setor da economia (excetuando-se aqueles que são monopólios estatais), você
sempre notará os mesmos padrões:
1) Quem, em última instância, determina se uma
indústria específica se tornou obsoleta são os consumidores;
2) São os consumidores que, ao mudarem suas
preferências de consumo e suas exigências de qualidade, determinam que uma
indústria específica que não mais os satisfaz tem de ser ou fechada ou
inteiramente remodelada e reestruturada.
Em definitivo, se você é um empreendedor, ou você se
adapta aos volúveis e inconstantes gostos dos consumidores e às novas
tecnologias disponíveis para satisfazer esses gostos, ou os próprios consumidores
farão este serviço por você, expulsando-lhe do mercado e impondo sua falência.
A única garantia de sobrevivência no capitalismo não
é o tamanho, mas sim sua superior eficiência em servir os consumidores. Quem não
satisfaz os consumidores quebra.
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