Este artigo foi extraído do livro Seis Temas para Entender o Mundo, publicado pelo IEE - Instituto de Estudos Empresariais.
Com a fixação do homem na
terra e o fim de sua condição de nômade, criaram-se pequenas comunidades que se
utilizavam da vegetação e da caça disponível na região para se alimentar e para
o sustento da família. Essas comunidades foram crescendo, multiplicando-se e se
expandindo e formando outros núcleos familiares, que procuravam delimitar suas
áreas de plantio de alimentos e de caça para subsistência dos seus núcleos.
Tem-se aí o início do processo de racionalização de atividades agrícolas, quando
alguns núcleos passam a se dedicar ao cultivo de grãos, e outros à caça. Dessa forma, surgiu o primeiro conceito de
comércio: o escambo, troca direta de mercadorias, por meio de um demanda
necessária. Nessa forma de economia, as mercadorias de maior valor são o boi e
o sal.
A moeda surgiu
como uma consequência natural do processo de trocas de mercadorias, bens e
serviços. Seu objetivo era o de organizar, facilitar e estabelecer padrões do
comércio de produtos, além de substituir a simples troca de mercadorias, a qual
era predominante. É a passagem da troca,
do escambo de um produto por outro, para as trocas indiretas, feitas por meio de
algo com valor intrínseco.
O gado foi a mercadoria-moeda
mais utilizada, pois tinha uma vantagem em relação às outras: enquanto era
guardado como uma poupança, essa moeda se multiplicava por meio da reprodução,
rendia juros. Mas também tinha suas desvantagens: o gado não podia ser dividido.
Para que uma mercadoria possa ser utilizada como moeda, ela deveria ter algumas
qualidades, como ter durabilidade, divisibilidade, homogeneidade e facilidade
de manuseio e transporte.
Nos primeiros
séculos de utilização das moedas, elas tinham um valor real, ou seja,
representavam fielmente seus valores de acordo com o metal que era usado na
fabricação. Após certo tempo, os valores passaram a ser nominais, não tendo
relação necessária com o tipo de metal.
Com a evolução
maior das sociedades e das divisões entre países, cada país passou a ter sua
própria moeda, tendo sua emissão e controle feitos pelo Estado. Dessa forma,
são criados os Bancos Centrais, que passam a ser os responsáveis por esse
controle de moeda e também pela supervisão de todo o sistema financeiro de determinada
nação.
Com o uso das moedas, cria-se um fenômeno chamado
inflação. A definição mais simples e utilizada a respeito da inflação é a da elevação
contínua do nível de preços, isto é, uma taxa contínua de crescimento dos
preços num período determinado. Porém, essa é apenas uma métrica do fenômeno,
sendo ele definido como a perda do valor da moeda em decorrência da emissão da
própria moeda em volume superior àquele demandado pelo mercado, sendo esta apenas
um instrumento de troca, como se fosse uma outra mercadoria ou bem qualquer.
Quando há excesso de oferta, é necessário oferecer mais dessa mercadoria em
troca de outra que manteve a sua quantidade original.
Mises, reconhecido líder da Escola
Austríaca de pensamento econômico, apresentou a teoria que afirma que, se um
governo aumenta a quantidade de papel-moeda, a consequência é a queda
progressiva do poder de compra da unidade monetária e a correspondente elevação
dos preços. A isso se chama inflação.
Porém, muitos países
preferem ver a causa da inflação não no aumento da quantidade de dinheiro, mas
na elevação dos preços. Até hoje nenhum autor apresentou qualquer contestação
séria à interpretação econômica da relação entre os preços e a
quantidade de dinheiro, ou da relação de troca entre a moeda e outros bens,
mercadorias e serviços. Nas condições tecnológicas atuais, os governos
poderiam fabricar pedaços de papel e imprimir sobre eles determinados valores
monetários. Portanto, é necessário que tenhamos políticas muito bem
ajustadas e severas para controle de emissão de moeda pelo governo.
Porém, o que muitos não sabem é que o fenômeno
inflacionário tem sua origem em um processo monetário de excesso de liquidez, que
é motivada principalmente pelos constantes aumentos do gasto público e das necessidades
de financiamento do governo central. Esses constantes aumentos dos gastos
públicos geram um déficit, originado basicamente de investimentos improdutivos,
corrupção e aumento do número de empregos públicos, que podem afetar no aumento
da inflação, mas não são a sua causa direta.
Investimentos
improdutivos são aqueles que não trazem
benefícios permanentes para a sociedade. Resultam, geralmente, de má
administração, pela alocação de pessoal não qualificado nos projetos. Resultam
também da necessidade de geração de renda para pagamento de comissões extras e
também para a entrega de projetos para empresas financiadoras de campanhas
políticas.
Na corrupção temos uma
série de exemplos de desvio de dinheiro para créditos pessoais e para
enriquecimento ilícito de políticos e seus "apadrinhados" - no caso do aumento
de cargos públicos, quando os políticos eleitos "pagam" seus cabos
eleitorais por meio de cargos públicos e, ao assumirem as funções, quando colocam
seus parentes e amigos em cargos de confiança. Esse enchimento da máquina
pública vai se acumulando ano após ano, onerando o contribuinte e destruindo
iniciativas bem-intencionadas no setor público.
Agora, para compensar esses
distúrbios no orçamento, o governo procede basicamente da seguinte maneira: efetua
aumento real dos impostos, os quais são repassados pelas empresas para o
consumidor; promove aumento real dos preços dos produtos das estatais (gasolina,
energia elétrica), com acréscimos acima da inflação; paga os títulos da dívida
pública, que vão vencendo, por meio da venda de novos títulos a taxas de
juros mais altas, forçando a alta dos juros e fazendo uma "rolagem da dívida";
atrasa o pagamento de fornecedores, que são
obrigados a elevar seus preços para compensar o atraso; emite papel-moeda
e levanta empréstimos junto aos bancos nacionais e internacionais, fazendo
subir ainda mais as taxas de juros.
Um padrão interessante seria aquele em que
a quantidade de dinheiro disponível é independente das políticas governamentais
e dos partidos políticos. Constitui-se, dessa forma, uma proteção
contra gastos indevidos dos homens públicos. Se um governo resolve fazer
gastos em um novo empreendimento, deverá fazer um planejamento de como irá
adquirir o dinheiro para aquela finalidade. Num sistema inflacionário,
nada é mais simples para os políticos que ordenar ao órgão governamental
encarregado da impressão do papel-moeda a emissão de quanto dinheiro lhes seja
necessário para seus projetos.
Sob condições inflacionárias, o povo se
condiciona a considerar o governo uma instituição que tem recursos ilimitados à
sua disposição, e a pensar que o Estado pode tudo.
Um exemplo recente é que,
em 2008, tivemos um colapso financeiro mundial, em que diversas empresas
praticamente quebraram devido resumidamente à má gestão dos seus recursos.
Grande parte dessas companhias estava situada nos Estados Unidos, uma das
economias mais liberais do mundo até então. Porém, o governo resolveu intervir
nessa questão, gerando um pacote de mais de um trilhão de dólares para salvá-las.
Essa conta será paga pelo
contribuinte americano, que já está sentindo uma elevação na taxa de juros
interna para conter as pressões inflacionárias da economia - o que mostra que
gastar errado o dinheiro do contribuinte, seja via imposto, seja emitindo
moeda, não é privilégio de países subdesenvolvidos.
Não há nenhuma maneira secreta para a
solução dos problemas financeiros de um governo: se este precisa de dinheiro,
tem de obtê-lo impondo tributos aos seus contribuintes ou tomando emprestado de
instituições monetárias internacionais. Entretanto, o empresário nem
sempre consegue transferir o valor dos impostos para os preços pelos quais
deseja vender suas mercadorias. O imposto é um valor a ser pago ao governo
obrigatoriamente em caso de venda, mas somente em caso de venda; entretanto, o
consumidor pode resolver comprar de um concorrente, ou mesmo outra
mercadoria. E o que acontece, se não se consegue vender, porque o potencial
comprador decidiu comprar outra coisa, é prejuízo.
Uma redução na carga tributária iria
acarretar em aumento da lucratividade das empresas, gerando maior
competitividade. Desnecessário lembrar que impostos são custos, e tornam as
empresas menos eficientes.
Em relação aos salários, vale
dar algumas explicações nesse aspecto, bem como a apresentação de alguns fatos.
Após
a Primeira Guerra Mundial, a Grã-Bretanha restabeleceu a equivalência entre o
ouro e a libra, numa correspondência que vigorava antes da guerra. Isto
é, elevou o valor da libra. Com isso, elevou-se o poder de compra dos
salários de todos os trabalhadores. Num mercado desobstruído, tal
alteração teria acarretado uma queda do salário nominal em dinheiro. Essa
queda, por sua vez, teria compensado a alteração. Como resultado final, o
salário real dos trabalhadores
teria permanecido inalterado. O fato é que os sindicatos da
Grã-Bretanha não admitiram um ajustamento dos padrões salariais ao poder de
compra mais elevado da unidade monetária; assim sendo, os salários reais foram
consideravelmente acrescidos em decorrência daquela medida monetária.
Isso representou uma verdadeira catástrofe para a Inglaterra, uma vez que a
Grã-Bretanha é um país predominantemente industrial, obrigado, por um lado, a
importar matérias-primas, produtos semiacabados e alimentos para sobreviver, e,
por outro, a exportar bens manufaturados para pagar essas importações.
Com a elevação do valor internacional da libra, os preços dos produtos ingleses
subiram nos mercados externos, causando um declínio das vendas e exportações.
Na verdade, para todos os efeitos, o que a Grã-Bretanha fez foi fixar os
próprios preços à revelia do mercado mundial.
Lamentavelmente
temos hoje, em quase todos os países do mundo, um segundo poder, depois do
governo, com condições de exercer força: são os sindicatos trabalhistas.
Essas entidades determinam os salários, bem como as greves que os devem impor,
da mesma maneira que o governo poderia decretar um salário mínimo. A
política sindical consiste em elevar os padrões salariais acima do nível que estes alcançariam
num mercado desobstruído. Em consequência disso, uma parte considerável
da população potencialmente ativa só pode ser empregada por pessoas físicas ou
por indústrias que tenham condições de suportar prejuízos. E uma vez que
os negócios não têm como se manter sob a sangria de prejuízos, eles fecham as
portas, e seus trabalhadores perdem o emprego. A fixação de padrões
salariais superiores aos que se estabeleceriam num mercado desimpedido redunda
inevitavelmente no desemprego de parcela ponderável da população ativa.
Os aumentos de salários não
se refletem diretamente nos índices inflacionários, sendo estes refletidos
apenas nas emissões de moeda. Em uma economia indexada, o governo, por ter de
aumentar salários - e sem outras fontes de recursos -,vê-se na obrigação de
emitir moeda para pagar esse aumento salarial. Com o livre mercado, os
preços são ditados pelo próprio mercado, que define quanto será pago por
determinado cargo ou função exercida. Isso acaba se refletindo diretamente em
benefícios aos usuários, que irão pagar por um serviço dentro das suas
condições e necessidades.
Uma falácia comum abordada pelos protecionistas é a de que o livre
comércio causa desemprego. Ele pode apenas causar um efeito sobre o salário dos
trabalhadores. O que acontece é que cada país tenderá a se especializar na
produção dos bens em que ele é mais eficiente que os outros. O livre comércio
não causa desemprego; o que ele realmente faz é mudar os padrões de demanda
dentro das economias, conduzindo a novos padrões de emprego. Podemos ter apenas
um desemprego transitório, enquanto os trabalhadores estiverem fazendo a
transição para novos padrões, porém não um desemprego permanente. Quem afirma
isso o faz porque jamais quer que haja mudanças na demanda por bens e nos
processos produtivos.
Como considerações finais,
chega-se à conclusão de que, na maioria das vezes, o governo gasto o dinheiro
com maus propósitos. Por meio de ostensivas tributações, o governo arrecada
cada vez mais, e acompanhamos uma deteriorização dos serviços públicos. A carga
tributária no Brasil é bastante elevada, considerando-se os padrões
internacionais; ademais, só vem aumentando ao longo dos anos. Segundo o IBPT (Instituto
Brasileiro de Planejamento Tributário), em 2009 os tributos arrecadados pelo governo
passaram de um trilhão de reais, valor que representa 36% do PIB brasileiro no
mesmo período. Pra que se tenha uma ideia do montante arrecadado, se esse valor
fosse dividido entre a população brasileira, seria como se cada indivíduo
desembolsasse mais de R$ 5 mil somente em tributos, o que dá quase R$ 15 por
dia. Ou seja, é o dinheiro que você poderia usar para usufruto próprio, da
maneira que bem entendesse.
É necessário que seja feita
uma completa reestruturação nas atividades do Estado, para termos uma liberdade
de escolha dos serviços que iremos utilizar. A cobrança de altas cargas de
impostos compulsoriamente e a emissão de moeda sem critérios de governança
travam o crescimento da população e empobrecem os serviços prestados pelo país.
Se os serviços são bons e necessários, os indivíduos naturalmente pagarão por
essas atividades prestadas pelo Estado. Na iniciativa privada, uma empresa que faz
uma má gestão dos seus recursos acabará indo à falência caso não consiga
oferecer ao mercado o que ele está demandando. Dessa mesma forma deveria ser
permeada a ação do Estado, com uma racionalização do uso do dinheiro público
para as atividades que estiverem sobre a sua determinação.